Pasteur: de Aluno Medíocre a Cientista Brilhante

Apesar de suas memoráveis contribuições ao estudo da microbiologia, Louis Pasteur (1822-1895) quando jovem revelou inclinação para a pintura. Considerado um aluno medíocre pelo seu professor de química, Pasteur sempre se mostrou uma pessoa obstinada, o que o levou a fazer descobertas em diversos campos científicos. Sério e introspectivo, o cientista francês também foi um excelente professor.

Raramente o mundo da ciência é questionado em nosso cotidiano e muito dificilmente os cientistas são apresentados com as suas contradições. Pelo contrário, normalmente a ciência é enaltecida e apresentada em tom triunfalista, por meio de descobertas aparentemente revolucionárias, e os cientistas, vistos como seres altruístas, isentos de conflitos internos, dúvidas e incertezas. Já expus aqui outros aspectos da personalidade de cientistas renomados como Darwin e Newton e agora vou falar sobre Pasteur.
Sem querer desmerecer a importância desses cientistas para a história da ciência, procuro ressaltar com estas postagens que a ciência é e sempre será uma atividade humana. No caso de Pasteur, a sua genialidade não surgiu do nada e sim da sua obstinação em explicar o que sempre pareceu inexplicável aos olhos do observador comum. Filho de um curtidor de couros, Louis Pasteur (1822- 1895) nasceu na pequena cidade de Dolé, no leste da França, a 370 quilômetros de Paris e até os 20 anos, ainda que aluno razoável, só tinha olhos para o desenho. Os trabalhos dessa época, que incluem pastéis, litografias e desenhos, estão expostos em seu museu, em Paris, e revelam uma técnica surpreendente, embora puramente intuitiva. 
Louis Pasteur iniciou os seus estudos no Colégio Royal em Besançon, onde se formou e recebeu junto com o seu diploma o veredicto implacável de "medíocre' de seu professor de química. Transferiu-se para a Escola Normal Superior em 1843 de Paris, onde estudou química, física e cristalografia. Foi na cristalogia que Louis fez suas primeiras descobertas. Descobriu em 1848 o dimorfismo do ácido tartárico, ao observar no microscópio que o ácido racêmico apresentava dois tipos de cristais, com simetria especular. Descobriu, portanto, as formas dextrógiras e levógiras, comprovando que desviavam o plano de polarização da luz no mesmo ângulo porém em sentido contrário. Esta descoberta valeu ao jovem químico, com apenas 26 anos de idade, a concessão da "Légion d'Honneur" Francesa.
"Em 1849, aos 27 anos, Pasteur foi nomeado professor de Química da Universidade de Estrasburgo, onde conheceu a jovem Marie Laurent, filha do reitor. Apaixonado a ponto de não conseguir concentrar-se em mais nada, decide pedi-la em casamento, não sem antes – como exigia a praxe da época – mandar uma carta ao senhor reitor explicando sua origem humilde e condição financeira apenas razoável. Pelo visto, a carta foi bem recebida, pois dois meses depois Pasteur casou-se com Marie, que permaneceria sua colaboradora dedicada por mais de 45 anos. O casal teve cinco filhos, mas três meninas morreram de doença ainda crianças, sobrevivendo apenas os filhos Jean-Baptiste e Marie-Louise. Jean-Baptiste seria o grande companheiro dos últimos anos do pai, quando este sofreu dois derrames sucessivos."
Conforme matéria publicada na revista Superinteressante, "Pasteur revelou-se um excelente professor. Sério, introspectivo, preparava as aulas meticulosamente, preocupado com todos os detalhes, procurando os termos mais adequados e um perfeito encadeamento de ideias. Jamais afirmava algo sem uma demonstração. Quando assumiu o posto de reitor da Universidade de Lille, em 1854, colocou em prática conceitos modernos de educação. Instituiu cursos noturnos para os jovens trabalhadores, levava os alunos às fábricas da região e organizava cursos práticos, para demonstrar a relação que acreditava existir entre teoria e prática. Nesse sentido, estava perfeitamente sintonizado com as melhores tendências de seu tempo tão carregado de inovações."
A pedido dos vinicultores e cervejeiros da região, começou a investigar a razão pela qual azedavam os vinhos e a cerveja. Utilizando o microscópio, conseguiu identificar a bactéria responsável pelo processo. Propôs eliminar o problema aquecendo a bebida lentamente até alcançar 48° C, matando, deste modo, as bactérias, e encerrando o líquido posteriormente em cubas hermeticamente seladas para evitar uma nova contaminação. Este processo originou a atual técnica de pasteurização dos alimentos. Demonstrou, desta forma, que todo processo de fermentação e decomposição orgânica ocorre devido à ação de organismos vivos.
Pasteur passou a investigar os microscópicos agentes patogênicos, terminando por descobrir vacinas, em especial a antirrábica que utilizou com sucesso em 1885 para tratar Joseph Meister, um garoto de 9 anos que fora mordido por um cão infectado pela raiva, utilizando-se de injeções diárias por 13 dias seguidos, com vírus cada vez menos atenuados. Meister nunca contraiu a raiva, felizmente, pois Pasteur, por não ser médico, arriscou-se a ser processado, caso o tratamento não tivesse sucesso. Depois, sucederam-se várias outras curas e a novidade se espalhou, levando um número cada vez maior de pessoas mordidas a seu laboratório – vindas não só de Paris e do interior da França como também de outros países, até da longínqua Rússia. Em 1886, de 726 pessoas tratadas, apenas quatro não puderam ser salvas e, mesmo assim, porque, mordidas no rosto ou na cabeça, só foram levadas a Pasteur muito tempo depois de atacadas.
No caso de Louise Pelletier, uma menina de 10 anos, mordida na cabeça e levada ao laboratório 37 dias mais tarde, Pasteur sabia que a vacina não teria nenhum efeito. Sabia também que seus adversários só estavam à espera de uma tragédia para retomar os ataques contra ele. Apesar disso, o desejo de salvar uma vida prevaleceu acima de qualquer consideração racional: Pasteur submeteu a menina ao tratamento, que, como ele imaginava, não deu resultado. Quando ela morreu , dias mais tarde, o cientista, que não arredara pé de sua cabeceira, teve uma incontrolável crise de choro.
"Em sua atividade, Pasteur exibia um caráter obstinado. Além de administrador da Escola Normal, onde ficou conhecido pelo seu apego militar à hierarquia e à disciplina, ensinava Química na Sorbonne e dedicava várias horas do dia à pesquisa, trabalhando até nos fins de semana.”Tenho a impressão de que estarei cometendo um roubo se passar um dia sem trabalhar”, dizia. Jamais deixou de prosseguir nas suas pesquisas, mesmo quando, no início de seu período como diretor da Escola Normal, o laboratório colocado à sua disposição não passava de um sótão inabitável. Depois de três anos ali, transferiu-se para um minúsculo pavilhão, onde, para que coubesse todo o material de que precisava, era obrigado a trabalhar ajoelhado", diz a Super.
Contudo, Meyer Friedman e Gerald Frideland em seu livro "As Dez Maiores Descobertas da Medicina" descrevem Pasteur como sendo "um autêntico francês: temperamental, egoísta, obsessivamente profundo ... excepcionalmente propenso a se valer de descobertas feitas por acaso ... Assustadoramente egoísta, relutante em reconhecer os feitos de seus predecessores e contemporâneos, às vezes um tanto desonesto, um exibicionista declarado e (paradoxalmente) inimigo ferrenho dos médicos – apesar disso tudo, é pouco provável que a França venha a ter outro cientista tão ilustre como ele". Já Gerald Geison em seu livro " A Ciência Particular de Louis Pasteur" faz um retrato ainda mais profundo e crítico de Pasteur, apresentado como um cientista tão talentoso e tenaz quanto despótico e ávido pela fama. Com uma narrativa original jamais produzida sobre sua ciência e personalidade, neste livro Geison descortina o homem e o cientista que existia por detrás dos mitos que compuseram a lenda, baseando-se e consultando exaustivamente o conteúdo de cerca de cem cadernos em que o cientista anotara em minúcias cada passo das experiências que realizara e que, a seu pedido, ficaram indisponíveis por quase um século. O livro traz, ainda, informações que frequentemente entram em choque com as versões públicas consagradas, não destruindo, porém, nossa admiração pelos méritos de Pasteur.
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