Mudança no Perfil Epidemiológico das Populações Indígenas


Mais de 50% da população indígena feminina já sofre com a obesidade
Mudança epidemiológica tem levado para as aldeias do país problemas como obesidade, hipertensão arterial e diabetes

Segundo dados do Censo 2010, hoje no Brasil vivem mais de 800 mil índios (cerca de 0,4% da população brasileira), distribuídos em 688 terras indígenas e algumas áreas urbanas. Os números não mensuram os dados que consideram a mais recente característica dessa população: o perfil epidemiológico e nutricional dos povos indígenas vive um cenário de transição.
Alterações nos padrões alimentares e de atividade física têm provocado drásticas transformações na saúde desse grupo, levando para as aldeias problemas como obesidade, hipertensão arterial e diabetes. A afirmação faz parte dos resultados do 1º Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição dos Povos Indígenas, uma realização da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e da Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco), com o apoio do Ministério do Desenvolvimento Social de Combate à Fome e sob a coordenação do pesquisador da ENSP e editor da revista Cadernos de Saúde Pública Carlos Everaldo Álvares Coimbra Júnior, com participação dos pesquisadores Andrey Moreira Cardoso e Ricardo Ventura Santos.
A hipertensão arterial se faz presente como consequência dessas mudanças e já é sinalizada como uma questão de saúde importante relacionada às mulheres indígenas, uma vez que atinge mais de 15% delas. Outro fator que é motivo de cuidados é a obesidade, que afeta mais de 50% da população indígena feminina. As crianças, por sua vez, apresentam desnutrição, diarreia, anemia e carteira de vacinação desatualizada.
O trabalho, embora revele situações que deixam as autoridades de saúde em alerta, comprova a preocupação maior em analisar os hábitos e aspectos relacionados à saúde da população indígena. E as pesquisas são abrangentes, reconhecidas nos estudos desenvolvidos na Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz) ao se tornarem objeto de diversas linhas de pesquisa e tema de dissertações de mestrado, como também teses de doutorado dos alunos na pós-graduação. Doenças respiratórias, doenças infecciosas, saúde de mulheres adultas e crianças, além das próprias mudanças socioambientais são exemplos de alguns dos trabalhos realizados.

O Inquérito Nacional

“O objetivo principal dessa pesquisa foi descrever a situação alimentar e nutricional das populações indígenas presentes em todas as macrorregiões do país. É a primeira vez que se tem uma pesquisa de base populacional e estatisticamente representativa dos povos indígenas das diversas macrorregiões do país”, afirmou o coordenador Carlos Coimbra. Com foco nas crianças menores de 60 meses e nas mulheres entre 14 e 49,9 anos, a investigação cobriu uma amostra de mais de 100 aldeias, nas quais foram entrevistados milhares de domicílios, mulheres e crianças.
O perfil de saúde e nutrição das mulheres indígenas, nas regiões Centro-Oeste e Sul/Sudeste, determina que a hipertensão arterial merece ser compreendida como uma questão de saúde significativa. “Os achados para esse grupo de mulheres evidenciam não apenas diferenças inter-regionais importantes, como também sugerem a ocorrência de um acelerado processo de transição em saúde nas várias macrorregiões, ainda que em graus distintos. As mulheres indígenas que vivem na macrorregião Norte apresentam menores níveis de escolaridade e maior quantidade de filhos. Os resultados também apontam para um perfil de saúde, referente às mulheres do Norte, em que sobrepeso, obesidade e níveis tensionais se mostram menos frequentes e mais baixos que nas demais macrorregiões”, destacou Coimbra.

Perfil das crianças

Ao abordar a questão das crianças, o pesquisador admitiu que os resultados do inquérito confirmam, em escala nacional, que a desnutrição, avaliada por meio do indicador baixa estatura para idade, traduz-se como um problema de enorme magnitude no Brasil, atingindo uma em cada três crianças indígenas. Na população residente na macrorregião Norte, as prevalências foram de mais de 40%. “Se levarmos em conta outros parâmetros nutricionais, como anemia, fica evidente a precária situação nutricional das crianças indígenas, que alcança mais de 50%”, ponderou.

Doenças respiratórias

A mudança de perfil da população indígena requer melhoria nas condições de moradia e saneamento. Em sua tese de doutorado, o pesquisador da ENSP Andrey Moreira Cardoso confirmou que modificações relacionadas a alguns aspectos da vida desse grupo interferem na prevalência de doenças respiratórias agudas. “É possível identificar claras iniquidades em saúde nos povos indígenas se comparados aos demais segmentos sociais, sendo mundialmente vulneráveis às infecções respiratórias agudas (IRA)”, revelou.
Em seu estudo, Andrey acompanhou 6.483 indígenas Guarani, contabilizando 666 hospitalizações concentradas em 497 indivíduos – a maioria em crianças na faixa etária abaixo de 5 anos (71,9%). E o pesquisador analisa: "As doenças respiratórias foram as principais causas de hospitalização (64,6%), sobretudo em menores de 5 anos (estes representaram 77,6%; menores de 1 ano, 83,4%). A taxa de hospitalização por IRA em menores de 5 anos foi de 23,7/100 pessoas-ano, superando em 7,4 e 5,4 vezes as taxas de hospitalização por diarreia e por outras causas, respectivamente".
A tese enfatiza também situações consideradas como fatores de risco expressivos para doenças respiratórias agudas, tais como: não ter salário fixo na família; baixa idade materna; dormir no chão; número de crianças menores de 5 anos adicionais no domicílio; localização do fogo principal no interior do domicílio sem divisória de cômodo. “Os resultados indicam condições de vulnerabilidade relacionadas à pobreza e a piores condições socioeconômicas, habitacionais, nutricionais e de atenção à saúde. Intervenções para minimizar essas iniquidades devem ser pautadas na garantia da subsistência, na redução da pobreza e da fome, na promoção de ambientes saudáveis e na atenção primária de qualidade”, justificou.

Fonte: Informe da ENSP (em 19/04/2012)

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