Acupuntura É Só Para Médicos?


Uma decisão do Tribunal Federal Regional da 1ª Região decidiu no final de março de 2012 que apenas médicos terão direito de praticar a acupuntura. A decisão do Tribunal resultou de ação movida pelo Conselho Federal de Medicina já há dez anos e veta que outros profissionais ligados à área da saúde possam praticar a acupuntura, caso de fisioterapeutas, psicólogos, farmacêuticos e mesmo outras pessoas sem formação convencional nessas atividades. Visitando a página da Scientific American Brasil me deparei com um artigo muito interessante do Dr. Ulissses Capozzoli, jornalista especializado em divulgação científica e editor da revista. O título da matéria, publicada no blog da redação é "Ciência e falsa ciência" e relata como a acupuntura passou curiosamente de ciência tosca à terapia revolucionária em 40 anos e hoje tem a exclusividade de sua prática  pretendida pelos médicos.
Acupuntura é uma técnica de inserir e manipular agulhas muito finas em pontos específicos do corpo com fins terapêuticos ou para reduzir a dor. Segundo a hipótese da medicina chinesa tradicional, esses pontos ficam em meridianos por onde flui a energia vital Qi. Esses meridianos não correspondem a nenhuma estrutura anatômica no nosso corpo.
A acupuntura começou a ser praticada no Brasil nos anos 60. O Conselho Federal de Fisioterapia foi o primeiro a reconhecer a prática, em 1985. Dez anos depois, outros cinco conselhos fizeram o mesmo, entre eles o de Medicina. Hoje, há 60 mil acupunturistas não médicos, segundo a Associação de Medicina Chinesa e Acupuntura Tradicional do Brasil (AMCT) e 9 mil médicos associados ao Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura (CMBA).
Não há legislação que regulamente a prática no Brasil. Os defensores da tese de que outros profissionais podem exercer a acupuntura lembram que tanto a Organização Mundial de Saúde (OMS) quanto o Ministério da Saúde reconhecem o caráter multiprofissional da atividade.Veja o que diz Ulisses Capozzoli:
"A pretensão de monopolizar essa prática por parte do Conselho Federal de Medicina não deixa de ser curiosa, levando em conta o que ocorreu em 1972, quando o então presidente americano Richard Nixon, numa visita à China, fez o que ficou conhecido como uma reabertura desse país para o Ocidente.
Essa redescoberta ocidental da China fez com que técnicas ancestrais fossem consideradas, em especial a acupuntura.
E qual foi a reação largamente majoritária dos médicos e seus órgãos representativos? A acupuntura foi considerada uma farsa, algo no mesmo nível de uma feitiçaria tosca e por isso mesmo tratada com repulsa e condenação. E o que acontece exatamente 40 anos depois?
No Brasil, médicos praticam a acupuntura e seus órgãos de classe vão à Justiça para que seus associados sejam os únicos autorizados a fazer uso dela. Apenas para localizar melhor o percurso recente da acupuntura no Ocidente, certamente vale a pena rememorar que o destaque dado a essa prática foi, de certa maneira, acidental.
 Ocorreu que, em 1971, o jornalista James Reston, lendário editorialista do New York Times, beneficiou-se da acupuntura para tratar de dores pós-operatórias devido a uma cirurgia para tratar de apendicite, quando estava na China. Reston relatou os benefícios da experiência e com a credibilidade de que desfrutava fez com que a técnica fosse considerada no meio científico americano.
A viagem de Nixon, que retirou a China de um longo isolamento, permitiu, em seguida, uma troca de informações inéditas entre cientistas chineses e americanos e a acupuntura, evidentemente, esteve incluída nessas considerações.
Demorou algum tempo, como costuma ocorrer na adoção de práticas/medicamentos na área de saúde, mas em 1996, finalmente, a Food and Drug Administration, a famosa agência reguladora americana na área da saúde, aprovou a prática da acupuntura nos Estados Unidos.
 O reconhecimento formal dessa técnica terapêutica eficaz, a ponto de boa parte de seus detratores iniciais agora pretenderem ter exclusividade na sua prática, é apenas um capítulo mais recente da história da ciência."
O Conselho Federal de Medicina argumenta que somente médicos podem fazer diagnóstico e tratamento. "Mas o diagnóstico da acupuntura não é o tradicional. Não se avalia a presença de doença, mas o equilíbrio energético. Está muito distante do que é feito pela alopatia", argumenta Dirceu Sales, ex-presidente do Colégio Brasileiro de Acupuntura.

A polêmica se arrasta desde 2001, quando o CFM ingressou com ações contra conselhos de outras categorias profissionais, como psicologia e terapia ocupacional, que permitiam que seus integrantes fizessem acupuntura nos pacientes. Todas as decisões garantiam o direito da prática da atividade as outras profissões.  O tema também é discutido no projeto de lei que define o que é ato médico, que tramita no Congresso. A proposta que está em análise não faz referência explícita à acupuntura e sim a técnicas invasivas.
Existem pesquisadores que são radicalmente contra o uso terapêutico da acupuntura ou de qualquer terapia alternativa, afirmando que os resultados obtidos nesses tratamentos devem-se meramente ao efeito placebo. O efeito placebo consiste na melhoria de sintomas clínicos não por uma ação eficaz do medicamento ou tratamento, mas simplesmente porque o paciente percebe que está sendo tratado.
 Em seu blog Cultura Científica, o físico e professor da Unicamp Leandro Tessler faz críticas severas às diversas técnicas de medicina complementar e alternativa e, especialmente,  em relação à acupuntura. Sobre a acupuntura, o prof. Tessler diz: " Apesar de numerosos estudos, nunca foi demonstrado de forma convincente que a acupuntura tem um efeito maior que o placebo. Dez entre dez adeptos de Medicina Complementar e Alternativa recorrem à acupuntura ou suas variantes auriculares para os mais diversos fins. E acrescenta: "Tudo indica que a acupuntura como é praticada atualmente não é milenar, provavelmente não é chinesa, e seus praticantes brasileiros apresentam um número de registro que não é de um conselho profissional. Mas afinal, para muita coisa não precisamos de mais que um efeito placebo..." E, mais adiante, declara: "Não tenho nada contra algumas pessoas preferirem os tratamentos complementares e alternativos. Cada um é responsável pelo que faz com sua própria saúde. Só que é feio (para não usar uma palavra mais forte) os adeptos dessas práticas apresentarem ao público leigo uma eficácia inexistente, baseada em estudos metodologicamente falhos, numa linguagem pseudo-científica rebuscada."

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