Onde Estão Nossas Mentes Brilhantes?


A baiana Joana Fidelis da Paixão, premiada na edição de 2006 do Jovem Cientista, seguiu carreira acadêmica e hoje é doutoranda em geologia marinha pela UFBa. Regra ou exceção?


Angela Zhang, uma jovem americana de 17 anos desenvolveu uma nova nanopartícula que tem potencial para ajudar no tratamento de diversos tipos de câncer. A criação de Angela Zhang  foi ganhadora na categoria individual do Siemens Competition Math, Science &Technology, um concurso promovido pela Siemens que tem o objetivo de revelar os novos talentos da ciência em todo o mundo. Zhang conseguiu desenvolver uma nanopartícula de ouro e óxido de ferro que pode ser enviada ao centro do tumor através de uma droga à base de salinomicina, também usada para combater o câncer. A substância "procura" pelos tumores e, por isso, é um ótimo meio para transportar a nanopartícula. Uma vez que atinge o alvo, ela mata as células-tronco do câncer de fora para dentro.
A chamada  nanopartícula multifuncional combina terapia e imagem em uma única plataforma, com os componentes de ouro e óxido de ferro permitindo tanto imagens de ressonância magnética e fotoacústica. Este nanosistema poderia ajudar a superar a resistência do câncer, minimizar os efeitos colaterais indesejáveis, e permitir o monitoramento em tempo real da eficácia do tratamento.
Zhang passou mais de mil horas nos dois últimos anos em pesquisa para seu projeto, em um programa de desenvolvimento de estudantes do ensino médio da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos e já tem planos para o futuro: deseja ser pesquisadora, mas ainda não definiu ao certo qual carreira irá seguir.
A adolescente revelou que ficou surpresa com a taxa de sobrevivência de pacientes submetidos ao tratamento contra o câncer atual. Por isso, decidiu pesquisar e criar um tratamento mais eficaz e menos categórico da doença. Por sua criação, Zhang levou um prêmio de US$ 100 mil dólares (cerca de R$ 180 mil reais).
Diante de um relato tão maravilhoso protagonizado por uma jovem norte-americana, uma pergunta se faz pertinente: onde estão as nossas mentes brilhantes? Ou melhor ainda: o que se tem feito no setor público ou privado para que as mentes brilhantes de jovens cientistas brasileiros possam reluzir? Será que faltam iniciativas, incentivos, investimentos? 
Há 30 anos o  Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) distribui um prêmio para estimular o interesse dos estudantes pela pesquisa. Todo ano, um pequeno grupo de estudantes do ensino médio, de graduação e pós-graduação vai a Brasília para receber o prêmio Jovem Cientista. Promovido CNPq pelo desde 1981, o prêmio contempla os melhores projetos científicos em cinco categorias, desenvolvidos em torno de um mesmo eixo A iniciativa de fato incentiva a opção por uma carreira científica? Que rumo tomam seus ganhadores?
Apesar do potencial desses jovens e do investimento do prêmio, Maria Clara Ulhoa, uma das coordenadoras do Serviço de Prêmios do CNPq, diz que o Conselho não desenvolve qualquer ação específica a fim de manter a ligação dos vencedores com a carreira científica. Mas fato é que, seja pela inclinação pessoal, pelo estímulo do prêmio ou por outros motivos, a grande maioria dos premiados continua envolvida, se não com a pesquisa em senso estrito, ao menos com a academia.
Vamos analisar agora  como se encontra hoje o desenvolvimento da pesquisa científica no Brasil e os seus principais entraves.
Entre as inúmeras dificuldades que emperram o desenvolvimento da ciência no Brasil destaca-se a concentração das investigações em universidades e institutos públicos, com uma contrapartida pouco significativa da iniciativa privada, além do fluxo irregular de recursos financeiros.Os cenários mais recentes, no entanto, acenam com perspectivas promissoras em relação a estas limitações. Empresas privadas estão se dando conta de novas perspectivas de negócios envolvendo pesquisa, desenvolvimento e aplicação. Do lado dos financiamentos públicos, os fundos setoriais – percentual de recursos obtidos com atividades como exploração de petróleo e energia elétrica, entre outros – devem ampliar sensivelmente os financiamentos destinados à pesquisa científica.
Portanto, para render os efeitos econômicos e sociais esperados das economias do conhecimento, a pesquisa e a ciência brasileiras precisam enfrentar ainda o desafio de integrar-se mais decididamente à atividade econômica privada, criando raízes nas empresas de forma a gerar inovação em produtos e serviços oferecidos no mercado. Nessa área, parece haver ainda longo caminho a ser percorrido.
De acordo com o estudo da Unesco, em 2008 o setor público ainda respondia por 55% do investimento bruto em pesquisa no Brasil, cabendo às empresas os 45% restantes – na União Europeia, o índice correspondente ao setor privado atinge 65% do total. Na opinião dos especialistas, o menor desenvolvimento da pesquisa empresarial não decorre de falta de recursos ou estímulos, pois há aqui ações de fomento competitivas com as de outros países: ele se deve, principalmente, a questões macroeconômicas, como a carga tributária e o custo do capital muito elevados. “Também é preciso mais estímulo à exportação, pois o mercado internacional exige competitividade, o que demanda mais pesquisas".
Contudo, o principal obstáculo ao desenvolvimento econômico e científico do Brasil, segundo uma  reportagem que saiu na  Revista Science, é a fragilidade do sistema educacional de base. Em entrevista à CH On-line, o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), o físico Marco Antonio Raupp, concorda: “Existe um déficit educacional muito grande. E sem educação não existe progresso.”
Embora a educação tenha recebido investimentos sem precedentes, nem todas as áreas têm a mesma atenção. “Enquanto a elite e o governo só investirem nas universidades, as desigualdades não serão superadas, pois só a própria elite consegue chegar ao ensino superior”, pondera Raupp.
Para o pesquisador, a desigualdade regional, também citada como desafio para o desenvolvimento, é na verdade consequência das falhas na educação básica. “O governo conseguiu universalizar a matrícula para o ensino fundamental, o que já foi um grande avanço, por garantir acesso a todos”, diz. “Agora, é preciso aumentar a qualidade do ensino e as condições de trabalho dos profissionais dessa área”, ressalta.
Outro entrave ao avanço científico no Brasil é a distância entre a pesquisa e a aplicação dos resultados na indústria. O número de cientistas empregados na área industrial não teve um crescimento tão expressivo, assim como o número de patentes nacionais (em 2009 foram concedidas, nos Estados Unidos, exatas 103 patentes a inventores brasileiros − apenas cinco a mais do que em 2000. Inventores indianos, por comparação, registraram 679 patentes em 2009, ante 131 em 2000). Raupp defende que essa realidade precisa mudar, já que qualquer programa de desenvolvimento sustentável precisa, em longo prazo, de inovação.
Não podemos deixar de destacar o empenho da jovem americana, que dedicou mais de mil horas em pesquisa para o seu projeto desenvolvido nos últimos dois anos numa instituição de ensino e a sua preocupação com a sobrevivência dos pacientes submetidos ao tratamento anticâncer. Vejam como é importante unir o útil ao agradável: a responsabilidade, o empenho e a dedicação da aluna aliados a um programa de incentivo à pesquisa para estudantes do ensino médio  de Stantford resultaram em sucesso. Fica impossível uma mente brilhante não resplandecer nessas condições.

Comentários

  1. O brasileiro tem capacidade de ir longe na questão da ciência, mas acho que falta incentivos e investimentos da parte do governo. O governo investe relativamente bem na ciência do país, mas acho que eles deveriam investir mais na parte do ensino fundamental e ensino médio das escolas públicas, pois, assim como o texto diz, não faz sentido investir em universidades se só a elite teve um ensino fundamental/médio para conseguir chegar até lá, e alunos de escolas públicas não tem esse privilégio.

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