Cultura ou Biologia?

A oxitocina é um hormônio associado a sentimentos de amor. Tanto está ligado à emoção que sentimos ao conhecer alguém especial como está relacionado com a emoção da mãe ao ver pela primeira vez seu bebê recém-nascido. Da mesma forma, a serotonina é um neurotransmissor associado ao prazer. Todas essas substâncias estão envolvidas em reações bioquímicas, e essas, por sua vez, por meio de uma longa cadeia de reações, estão relacionadas ao comportamento. Reações que partilhamos com várias outras espécies animais e que levam à pergunta: até que ponto  podemos considerar o comportamento humano resultado da cultura ou fundado em bases biológicas? Para enriquecer  a discussão, o biólogo Ricardo Waizbort, da Fundação Oswaldo Cruz ( Fiocruz), está criando um programa de computador com imagens e informações, interconectadas por links, para que o usuário chegue as suas próprias conclusões.
O projeto, que procura discutir a história e as implicações filosóficas da teoria da evolução para a vida humana, teve, em 2009 - Ano Internacional da Biologia e quando se comemoraram os 200 do nascimento de Charles Darwin e os 150 anos da publicação da primeira edição de A Origem das Espécies -uma motivação a mais para debater o assunto.
Quatro percursos conceituais já foram definidos para a implantação do projeto: adolescência, comportamento sexual, medo e altruísmo. No medo, por exemplo, o projeto aproveita estudos já conhecidos que mostram que tantos seres humanos como macacos são mais facilmente condicionados a demonstrar medo frente a cobras e aranhas que com relação a objetos neutros como flores ou pedaços de madeira. 
Um exemplo clássico em que o comportamento acabou provocando mudanças físicas físicas é o pavão. O comportamento e a escolha das fêmeas acabaram provocando alterações na cauda dos machos. A beleza da cauda, no caso, expressa saúde, característica desejável a ser repassada aos descendentes e, por isso, importante na escolha do parceiro.
Em relação ao altruísmo, o projeto parte igualmente de bases teóricas para mostrar como surge, em termos evolutivos, a cooperação entre os indivíduos de uma mesma espécie, particularmente aqueles geneticamente aparentados, ou seja, pertencentes a uma mesma família ou bando. Segundo Waizbort, em organismos com cérebro e emoções mais elaborados, sentimentos de gratidão, senso de justiça, raiva para punir o trapaceiro, culpa - que leva à preocupação com a própria reputação - contribuem para manter essa cooperação estável. Os exemplos da natureza são muitos. Há os morcegos-vampiros, que precisam ingerir sangue a cada 72 horas. Como nem todos os animais de um bando conseguem alimentar-se nesse período, alguns dos que conseguem regurgitam parte do sangue para nutrir os demais. Há sanções para os que não agem altruisticamente.
O ciúme, emoção fartamente explorada pela literatura, também é considerada no projeto. Do ponto de vista biológico, vários animais machos, ao derrotar um rival, matam também os seus filhotes. É uma questão biológica de, de fazer prevalecer sua própria descendência. Até mesmo o organismo da fêmea disputada induz um período fértil e ela praticamente obrigado a aceitar o novo macho. Mas, se um por um lado, reagem com bastante agressividade à aproximação de outros machos a seu hárem e da mesma forma dominam suas fêmeas, por outro, essas, fêmeas , quando podem, não deixam de copular com outros machos.
Juntas, a linguagem e o aprendizado mudaram o ser humano. Mas é bom não esquecer que ambas atuam sobre uma base biológica. "Não se aprende a ter ciúmes, que é uma emoção inata a várias espécies. Mas o ser humano, até certo ponto, aprende a controlá-lo. Alguns biólogos consideram que o ciúme é uma adaptação, cuja função seria manter o parceiro atual", explica. E acrescenta: "Quando se fala em componentes biológicos, temos de levar em conta que estamos falando de componentes que se somam a outros socialmente construídos"

Para saber mais sobre comportamento animal, clique no marcador etologia ou no blog "Etologia no Brasil" na seção Biologando...

*Adaptação do artigo homônimo de Rosilene Ricardo, publicado na revista Rio Pesquisa da Faperj, edição nº 10 de março de 2010.

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