Educação: A Ditadura da Nota


Novos tempos, novas maneiras de ensinar, novas formas de avaliar a aprendizagem. Será? Infelizmente, o que se vê pelas escolas deste Brasil afora é uma mudança muito tímida nos métodos avaliativos utilizados. Ainda imperam na grande maioria das instituições a velha e nem tão boa prova, a ditadura da nota, maneiras ultrapassadas e pouco eficazes de dimensionar o que os alunos estão aprendendo.
Nos dias de hoje constatamos que escola tornou-se uma instituição que gasta mais tempo dizendo o que os alunos sabem do que fazendo-os avançar. Pior, uma instituição que habitou a só saber dos alunos aquilo que é preciso dizer aos seus pais. Como uma medicina cujo principal objetivo seria produzir boletins de saúde.
Como chegamos a isso? Dando ao sistema educativo um poder de seleção e, portanto, como se acredita, com ou sem razão, de decisão sobre a vida das crianças e dos adolescentes. Quando os pais confiam seus filhos a um centro de lazer, a um clube esportivo ou colônia de férias, eles querem ter notícias, ou seja, saber “se está tudo bem”. Eles não têm a sensação de que o futuro de seus filhos está em jogo ali a cada dia, ao passo que a escola os preocupa porque ela detém as chaves do futuro.
A maioria dos pais vive a escolaridade de seu filho como uma longa marcha incerta, pontuada de provações e perigos. Sem dúvida, porque aprender a ler, escrever e contar já não é suficiente, porque o sonho dos pais de classe média é que seus filhos tenham ensino superior e êxito social-e define-se o fracasso em função dessa ambição.
Na medida em que vivem a escolaridade dos filhos sob a ameaça de um fracasso, de uma exclusão ou simplesmente que sejam relegados às carreiras de nível médio sem futuro, é normal que os pais preocupem-se com o que se passa na sala de aula, esmiúcem os boletins escolares, perscrutem os índices precursores de um fracasso. O apego às notas, além da familiaridade com esse sistema, tem a ver antes de tudo com o sentimento de que são indicadores claros e precisos das chances de êxito escolar: se as notas são boas, é porque “as coisas vão bem” , mas mesmo assim é preciso manter-se atento; se elas baixam, há contatos com os professores, vigilância mais estritas das saídas, das diversões, dos deveres, chantagem com a mesada ou outras formas de pressão. Se as notas ficam muito tempo abaixo da média, é o conjunto de atitudes drásticas: repreensões, castigos, aula particular, psicólogo, transferência de escola...
Quem conhece o modo de fabricação das notas escolares sabe que elas não dizem grande coisa sobre o nível real de conhecimentos de um aluno, uma vez que elas o situam em relação à sua classe. O mesmo aluno terá boas notas em uma classe fraca e notas medíocres em uma classe forte. Deve-se lutar para substituir as notas por apreciações qualitativas detalhadas e complexas? De que adiantaria, se os pais, no final das contas, querem simplesmente saber se as coisas vão bem ou não?
O desafio, então, é fazer da avaliação um verdadeiro instrumento de pilotagem das aprendizagens. Fazer com que, ao longo das décadas, os professores estejam cada vez mais bem armados para compreender os obstáculos e as resistências às aprendizagens, para avaliar de maneira mais precisa tanto às aquisições quanto ás maneiras de aprender. Não conseguir isso seria a verdadeira derrota da democratização dos saberes na escola.
* Postagem elaborada a partir de artigos publicados na revista pedagógica Pátio, maio/junho de 2009

Comentários

  1. A avaliação é, sem dúvida, o memento mais desafiador na profissão do professor. Em que medida avaliar? Quanto vale esse o aquele conhecimento? Vivemos uma educação de notas há muito tempo, mas a cada dia isso piora. É só olharmos na nossa própria escola. Quantos alunos querem realmente aprender? E quantos querem notas para "passar"? Até a disciplina e a frequência escolar são, muitas vezes, condicionadas aos pontos. "Quem não se comportar vai perder ponto!" "Quem tiver 100% de frequência vai ganhar um ponto!" Quem já não ouviu e/ou disse isso? E o que temos são alunos que estão presentes fisicamente, mas, infelizmente, não estão nem aí para as aulas. E os pais? Quem disse que estão interessados no aprendizado, nos valores e conhecimentos adquiridos na escola? Querem que seus filhos não fiquem reprovados e que consigam o diploma, só isso. Muitos só aparecem na escola no final do ano, alegam que trabalham demais, que não têm tempo, que tem outros filhos para tomarem conta, são separados, desempregados, blá, blá, blá... Mas, no final do ano estão marcando presença e fazendo pressão, com histórias de lamentações...
    Ainda tenho esperanças nas mudanças, mas, ao mesmo tempo, não sei se verei isso...

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  2. A ditadura da nota não tem efeito só sobre o aluno,o excesso de provas com elaboração, correção e lançamento de notas toma a maior parte do tempo de trabalho do professor.Não temos tempo para a atualização do conhecimento.
    Outras formas de despertar o aluno para a importância do estudo seriam boas,mas isto exige mudanças radicais e investimentos em educação.Turmas pequenas, mais tempo com os alunos, laboratórios, trabalhos de campo etc.
    Em outro sistema a avaliação poderia ser mais completa. Acho que a avaliação formal(prova e nota)é necessária, só não deveria ser a única forma. Sem tantas provas alunos e professores renderiam mais.
    Gloria Maria

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